TV Degase: audiovisual gera interesse profissional em jovens internos
“A TV Degase representa um recomeço para mim, um lugar onde estou reescrevendo parte da minha história e, ao mesmo tempo, trabalhando para ajudar outros jovens a reescreverem a deles também”. A fala é da estudante de pedagogia Rebeka Terra, de 27 anos, que viu sua realidade se transformar a partir do projeto desenvolvido pelo Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase). Quando tinha 15 anos, após conflitos familiares e a separação dos pais, ela saiu da escola e se envolveu com o crime. Rebeka chegou ao Degase com 16 anos sem saber como expressar seus sentimentos de revolta e incompreensão.
- Quando cheguei ao Degase e recebi roupas limpas e um par de sandálias, tive minha dignidade de volta. Veio também a reflexão do porquê de eu estar ali. Eu não acreditava em mim, e as pessoas que participaram desse processo da minha vida me ajudaram a resgatar essa confiança – contou.
Rebeka fez parte da primeira turma da TV Degase, em 2010. O projeto oferece curso de capacitação na área audiovisual e inclui filmagem, edição de vídeos, roteirização, reportagens e entrevistas. A iniciativa de profissionalização, em parceria com a Secretaria Estadual de Educação (Seeduc), atende adolescentes que cumprem medida socioeducativa de internação. Atualmente, os cursos são divididos em ciclos de 2 meses, com 20 jovens por turma.
- A TV foi meu primeiro desafio na timidez. Eu era muito tímida e, por ter um português razoável, era sempre convocada para fazer entrevistas. Com 18 anos, no dia do meu aniversário e a extinção de medida, ganhei minha primeira viagem de avião para conhecer os estúdios de produção do Maurício de Sousa, em São Paulo, com direito a festa surpresa e tudo. Pouco a pouco, com muita insistência e convites do meu professor psicopedagogo, eu de fato ganhei mais contato com audiovisual – disse.
Hoje, Rebeka faz faculdade de pedagogia da Universidade Federal Fluminense (UFF) e trabalha com audiovisual. Ela atualmente é diretora da TV Degase e trabalha diretamente com os adolescentes internos.
- Nossa relação é ótima. O fato de ter sido interna e hoje ser instrutora deles traz uma proximidade e confiança a mais. Quando vamos nas unidades, sempre nos param e pedem para participarem da TV, isso quando não são alunos que já fizeram e querem fazer de novo o curso, isso acontece muito. Sinto que, no nosso espaço de aulas, eles ficam mais soltos, mais autênticos e confiantes – ressaltou.
Rebeka Terra falou sobre a importância do projeto para os jovens.
- A principal proposta da TV Degase é devolver a identidade desses meninos e meninas. A gente costuma dizer que funciona como uma janela onde quem está lá fora pode enxergar esses adolescentes de outra forma e se relacionar com eles de outro jeito; e eles, aqui dentro, podem se relacionar de uma maneira diferente com o mundo lá fora. Nós costumamos fazer isso por meio das entrevistas, e toda a construção de pauta, perguntas, roteiro, tudo é feito com a participação deles. Tudo isso traz valorização para eles, os jovens se sentem inseridos, importantes, vistos – disse ela, acrescentando a importância da reintegração social aqui fora, pois “aqui é que a vida acontece de verdade”.
A interna Júlia (nome fictício), de 16 anos, está há dois meses no Degase e faz parte do projeto.
- Esta oportunidade é muito boa para mim, estou vivendo algo que nunca tive acesso, gosto muito do curso e das professoras – afirmou.
O adolescente André (nome fictício), de 17 anos, também se sente motivado com a oficina.
- Desde que entrei na TV Degase, em 2019, me sinto muito bem. Nesse espaço pude amadurecer, aprendi muitas coisas. É muito legal fazer as entrevistas, aprender a falar melhor... quando eu sair daqui pretendo fazer outras atividades assim inspirado na TV Degase – falou.
Ao longo de sua história, mais de dois mil jovens já passaram pela TV Degase. Este projeto ganhador da Medalha Pedro Ernesto, da Medalha Tiradentes, entre muitos outros, é citado no Relatório do Conselho Nacional de Justiça como um modelo de ação que deve ser replicado em todo o Brasil.